Altamente qualificadas, as executivas do setor querem abrir caminho para o desenvolvimento de novas gestoras
Há seis meses, a rotina de trabalho da administradora Sheilla Albuquerque mudou. Desde quando assumiu o cargo de CEO do AgroGalaxy, ela passou a dirigir a companhia com 2.700 colaboradores, 150 pontos de venda e mais de 24 mil de clientes.
O desafio de Sheilla traz dupla responsabilidade: gerir e fazer crescer uma das principais plataformas para revenda de insumos do Brasil e promover o desenvolvimento de novas lideranças femininas na companhia.
“Eu sempre almejei desafios maiores, para me aprimorar, nunca um posto. E fui me preparando para isso. Se eu estou aqui hoje, outras mulheres podem também”, diz Sheila, que tem como uma das metas fomentar o desenvolvimento das mulheres para que elas representem 30% do total de líderes da companhia até 2030. Hoje, são 16%.
Assim como Sheilla, outras lideranças femininas vêm se destacando no agro brasileiro. Em comum, elas têm o fato de serem as primeiras mulheres a alcançarem o posto mais alto dentro de suas empresas.
É o caso a engenheira química Ana Claudia Cerasoli, que desde fevereiro é CEO da Corteva no Brasil, depois de ocupar igual posto na companhia para a região Mesoandina, que contempla os mercados de México e Peru.
“Conforme fui crescendo na carreira e trabalhando para desenvolver minhas habilidades, com mentorias, planejamento e muito trabalho, fui entendendo que eu poderia ter uma carreira maior do que imaginava,” diz ela.
O preparo e a capacidade de atuar em diversas frentes ao longo das carreiras é outro ponto em comum entre as executivas. A médica-veterinária Fernanda Hoe assumiu no final de 2021 a diretoria-geral da multinacional norte-americana Elanco, cargo mais alto da companhia no Brasil.
Fernanda lembra que iniciou sua carreira na área técnica, fazendo trabalho de campo, depois atuou em marketing e em pesquisa e desenvolvimento. Em todas essas fases investiu em estudos e formações complementares.
“Cada uma dessas experiências me possibilitou entender a empresa como um todo e me preparar para os desafios e responsabilidades que eu teria à frente. Eu almejava uma posição de diretoria de marketing, para mim já era o topo da carreira, depois, vi que eu podia muito mais”, revela a executiva.
Assim como Fernanda, as mulheres que atuam no agronegócio investem cada vez mais em formação e capacitação. Em 2021, a consultoria Agroligadas em parceria com a Corteva, Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) e Sicredi fez um levantamento da presença feminina no setor.
O estudo “Elas fazendo história” ouviu 408 profissionais do agronegócio em todas as regiões do país. Do total, 41% tinham pós-graduação, ante 12% do estudo anterior, de 2018. No entanto, apenas 17% delas atuavam em cargos de supervisão ou direção das propriedades rurais.Levantamento do Ministério da Agricultura e do IBGE aponta que 1 milhão de mulheres administram cerca de 30 milhões de hectares no Brasil, o equivalente a 8,9% da área total de estabelecimentos rurais, um número ainda pequeno.
“A gente vê é que os tomadores de decisão nas propriedades ainda são os homens, isso tem mudado lentamente, precisamos desenvolver iniciativas para que esse processo se acelere”, pondera Ana Cerasoli, da Corteva.
Essa realidade fica clara no dia a dia, seja em reuniões ou eventos de campo. “Muitas vezes eu sou a única mulher na sala em reuniões, mas vejo isso também como uma oportunidade de mostrar que temos muito a agregar na gestão de negócios e desenvolvimento de projetos”, pondera a diretora-executiva do Sindálcool, Lhais Sparvoli, que há um ano e meio assumiu a gestão da principal entidade do setor de energia e biocombustíveis de Mato Grosso.
“Nós temos ocupado espaço aos poucos e acho que o nosso desafio é trazer para junto de nós outras mulheres, para que elas tenham condições de se desenvolverem e conquistarem os cargos que almejam”, diz Lhais.
A administradora de empresas e pecuarista Mariana Tellechea lembra que no início de sua carreira, enfrentou desafios por ser mulher. “Quando perdi meu irmão e, pouco depois, meu pai, me vi tendo que administrar as propriedades da família, gerenciar uma equipe majoritariamente masculina e enfrentei resistência”.Atualmente, Mariana preside a Associação Brasileira de Angus, sediada no Rio Grande do Sul, a primeira mulher a assumir o cargo. “Acho importante que todos nós possamos trabalhar para fazer a associação crescer e se fortalecer de forma conjunta.”
No dia a dia da entidade, ela conta com outras mulheres no time, incluindo nos cargos de diretoria e gerência geral. “Isso é resultado do preparo dessas mulheres para desenvolverem um trabalho de excelência nas áreas em que atuam”, pondera.
A pesquisa Women in Business, feita pela consultoria Grant Thornton em 2022, apontou que a proporção de mulheres em cargos de alta liderança em empresas de médio porte no mundo pouco variou, de 31% para 32%, em 2022.
O Brasil está acima da média mundial, com 38% dos cargos de alta liderança ocupados por mulheres. Esse aumento significa também uma mudança na perspectiva para as novas gerações de profissionais.
“Esse é um trabalho importante, de abrirmos espaço e plantarmos hoje as sementes para que as futuras líderes possam colher frutos e continuarem trabalhando para que mais mulheres alcancem postos de liderança”, pondera Sheilla Albuquerque, do Agrogalaxy.
Para Fernanda Hoe, da Elanco, mais do que criar postos para mulheres, o setor precisa criar ambientes favoráveis para o seu desenvolvimento.
“Temos investido em criar condições e oportunidades para que as mulheres se desenvolvam, para que consigam equilibrar as responsabilidades com outros aspectos da vida que são relevantes para o bem-estar”.
Para Ana Cerasoli, da Corteva, a diversidade de gênero enriquece não só o ambiente de trabalho, como traz melhores resultados, já que a diferença de opiniões, formações e maneiras de enxergar o mundo possibilita debates saudáveis, que geram melhores resultados e satisfação para os colaboradores. “Só temos a ganhar”.
Fonte: Globo Rural